26 de março de 2012


Quando era pequeno beijei uma menina escondido no pátio de meus vizinhos, e fui flagrado. Meus cabelos são incontinentes em sua rebeldia. Não há corte, penteado ou jeito que os amanse, parecem com as nuvens dos céus que eu sempre procurei perscrutar: indomáveis, insanas, incessantes, incontroláveis. Quem sabe tudo não tenha começado naquela advertência no jardim. E hoje se desenrola nesse homem que não se encaixa. Que entende que não é simétrico o suficiente, que não possui os dotes que deveria, e que, aprisionado em suas formas carnais, não encontra amparo nas aprovações que tenta construir para si. Aquela menina do beijo hoje parece à minha frente, realizada por escolhas e conjeturas, está emoldurada em caminho semelhante ao meu mas diametralmente oposto. Àquela época, com candura, fui presenteado por ela com um microfone, rosa. Acho que eu fazia 5 ou 7. E essa é a primeira vez que uso números por aqui. Tamanha é minha congestão mental deles. Estou tomado por algorítimos que me cobram, exigem, que me prensão em uma parede que não é táctil. É da ordem daqueles elementos que determinaram que meus fios de cabelo seriam ariscos, meu rosto redondamente incômodo, e minha pele erupta. Minha vida é uma guerra sem intervalos, uma batalha sem descanso, uma espécie de corrida onde cada passo dado significa. É como se eu vivesse dentro de um eterno tornado em colapso. Sedento por levar ao chão os retratos, os desejos e as histórias lindas pregadas nas paredes que algum dia autorizaram que eu deixasse de viver por mim. 

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