30 de julho de 2009


É como aquele vento gelado que nos calou naquela tarde já quase noite lá perto do pôr-do-sol mais bonito da terra. E todos os minutos em que eu esperei por uma palavra tua foram como aquela lembrança, doce, amarga, daquele dia em que você fez de todo meu céu pura prata. E eu sinto em te dizer mas eu já não consigo mais entender o porquê, eu desisto de querer compreender tuas razões porque não suporto a dor de ter sido escolhido pra ser traido, e de ter ouvido, da tua boca, aquelas palavras todas, que me feriram tanto que eu até acho que vou viver muito mais do que eu achava porque nenhuma das gotas pontiagudas me levou a vida. E é tão engraçado que se eu não te amasse eu não estaria aqui, escrevendo isso, estaria indiferente, sorrindo por ai como eu bem sei fazer, afinal, quem mais alicia as pessoas com sorrisos como eu? Naquela noite gelada eu decidi deixar de lado todo aquele turbilhão que eu sempre tento domar desde que a gente é a gente. E essa desistência não leva embora tudo aquio que você me trouxe de bom, e todas as vezes em que eu senti que consegui te fazer feliz, porque esse foi sempre o meu objetivo. E não pela primeira vez pago o preço de cruzar aquela linha, imaginária, que sempre me coloca do lado que não é meu, a serviço daqueles a quem me devoto, e no fim, eu sempre acabo tendo que quitar uma prestação que não é minha, porque tudo que eu sempre fiz foi por você. E esse é aquele em que meu céu se enche de brisa, e todas as nuvens mexidas não me deixam dúvidas. Eu só queria que você soubesse que eu preciso que você parta, já há tempo que eu sabia que a tua estrela precisava ir, porém hoje, não me resta mais desculpa pra me enganar, o fato é que mais uma vez, apesar de te amar, preciso que você parta, e se você não assim quiser, eu parto, sem deixar pra trás, tudo de perfeito e aquele sonho que você me deixou viver contigo.

27 de julho de 2009

Eu te amei de um jeito tão intenso e secreto e perpétuo que é até estranho falar sobre isso porque eu achava isso era tão meu e estava tão guardado que eu nunca pretendi escrever sobre. E eu nunca consegui colocar isso pra fora porque sempre imaginei que desfazer esse segredo comigo mesmo significava perder o pouco de você que eu julgava que tinha e esse era um preço que eu não estava disposto a pagar. E todas as vezes em que lia alguma palavra tua, ou esperava alguma ligação, ou escutava algum anseio teu, eu sempre tinha a disposição, irrefreável, de tentar te satisfazer porque isso me mantinha perto de você. E essa ilusão que eu criei de que um dia você ia perceber tudo aquilo que eu sentia por você sem precisar dizer, e que você estaria disposto a viver tudo aquilo que a gente podia ousar, e que por um momento, em algum instante, desse tempo que a gente passava junto você ia olhar pra fora, essa esperança inversa, que me fazia lutar contigo pelo que você queria, acabou me calando e me destruindo enquanto nos desconstruíamos continuamente. E chegou um dia em que a onda da praia levou o castelo inteiro, e quando eu abri meus olhos só havia areia e água e nem mais uma coluna estava de pé. Quando eu decidi te entregar em palavras de outros, aquilo que eu tentei conseguir te dizer e nunca disse, eu estava optando caminhar pela mesma praia onde durante toda a minha vida viveu um espectro, do sonho, inconsciente, talvez, daquilo que eu imaginei que um dia, quando sorria pensando em você, que eu chegaria perto de viver, algo que eu queria mais do que tudo. E foi o querer que me levou até tão longe e se eu posso usar esse cenário eu queria te dizer que se alguma vez alguma coisa foi teatral era porque eu estava me traindo quando fazia tudo que podia por ti, porque o meu gostar de você era tão grande, e engraçado, e terrível, que toda a confusão que eu sentia nunca me deixava claro qual definição usar quando eu chegava perto de você. E essa busca, por essa essência, que um dia eu empreendi, eu queria que você soubesse agora que arrefeceu. E eu te digo que está acabado porque é na operação do tempo, que a gente sente se a página foi virada, e se a estação se sucedeu, é como quando a pele da gente já não se arrepia mais porque o inverno partiu. E ai temos a certeza que a primavera vem em seguida. E esse é aquele em que eu tento te dizer, por mim, o que foi que se operou naquele verão, singular, que apesar de todas as nossas diferenças e incongruências, inconciliáveis e desastrosas, eu tive o prazer e a realização de viver.

7 de julho de 2009



É como uma chuva celestial de prata torrencial, e todos os pontos, cintilantes, que eu assisti durante todo o tempo do mundo no céu, e que eu achava que eram a maior nuvem e a mais bela de minha vida que eu já fotografei, desabavam sobre mim. Por um instante achei que não fosse real, e quando eu olhei pros lados vi que eu estava sozinho e que aquele céu luminoso me alcançava e já não brilhava mais, quando eu pude notar, não eram gotas o que caia do céu, e sim infinitas agulhas esculpidas em prata, milimetricamente recortadas, olhei pra todas os lados e só chovia prata, e quando me dei conta que eram frias, e pontiagudas, e reais, e que me feriam eu tentei gritar mas minha boca foi toda completamente coberta por picadas, e quando eu senti minha pele imersa em prata não conseguia mais distinguir o que era dor e o que não era, e meus olhos foram ficando escuros, porque segundo a segundo as agulhas iam cobrindo minha irís, e fixando minha pálpebra, e logo eu já não enxergava mais, e então eu não sentia mais nem o gelado da prata nem o vento da tempestade pontiaguda porque minha carne estava sendo comprimida e todos os espinhos, como num passe de mágica tomavam vida, e derrepente percebi que em uníssono, todos marchavam pra dentro de mim, e logo senti todo o meu sangue que vertia de cada poro de minha pele e de minha alma escorrendo, e quando voltei a enxergar por instantes porque as agulhas fizeram tanto peso que caíram de meus olhos, percebi que não havia mais nada além de metal ao meu redor, e nenhum passo eu conseguia dar, nenhuma palavra eu podia proferir, porque as agulhas me engessaram por dentro e me deixaram oco, e eu escorri naquele chão que eu já não podia ver porque o céu estava escuro e a nuvem cintilante, do prateado mais imponente, tinha tomado todo o céu e todo o sol, e o chão estava coberto de espinhos, e meus pés estavam banhados nas agulhas, e como numa apoteose de metal e sangue eu queria que você soubesse que eu fui dilacerado pela violência da chuva, e a tempestade que me obliterou, teve êxito completo, porque as agulhas que caminhavam dentro de mim encontraram meu coração e o venceram, e quando me dei conta que estava coberto por prata e escuridão, e que eu já não sentia mais nada, percebi que eu já havia partido e que eu não queria perceber. E todos os céus se apagaram, e todas as estrelas se extinguiram, e todas as palavras faliram e esmoreceram pra que você nunca esqueça que tem toda a maestria e a perfeição dignas do êxito de um deus.

5 de julho de 2009


É como a foto antiga que envelhece, e amarela, perde a intensidade de cada cor mas não se apaga. E são como as pétalas da rosa mais vermelha que desbotam e caem pelo chão, e apesar de todo o tempo do mundo, e de todas as intempéries, continuam vermelhas e perfumadas. E agora é tão inverno quanto antigamente e eu me lembro daquele tempo em que a gente convivia por conveniência ou destino e eu ainda me lembro daquela enigmática sensação que você sempre provocou em mim, eu lembro das muitas tardes, e manhãs, e de todos os dias em que lutei pela tua volta nos meus dias, porque era tão longe e tão difícil e improvável te fazer voltar pra dentro dela, e tudo me separava de você porque você era como aquele caule cheio de espinhos que me feriria se eu tentasse te tocar,e nossos mundos se desencontravam, e eu tive que operar meus esforços através da história, e o acaso acabou por aprimorar meus passos e aquelas velhas fotos passaram a ser passado do nosso presente porque novos retratos foram sendo tirados e ai você voltava a colorir o cinza do meu presente e você estava ainda mais marcado no meu sentir, mesmo sem nunca ter sabido disso, porque aquele enigmático sentimento que você me causava e aquela sensação que percorria meu corpo inteiro quando eu estava com você se reiteravam e então quando eu abri meus olhos, e olhei pra fora naquela hora, eu percebi que durante todos os longos anos em que eu lutei por você, por mim, e por aquele passado que me insistia em dizer que não era só definitividade do tempo, naquele dia daquela noite qualquer em que eu deitei e olhei pro teto, como nas primeiras vezes em que você voltava pra cena da minha vida, eu percebi que talvez eu sempre gostei mais de você do que eu deveria, e como naquele tempo isso não podia ter nome, e talvez não tinha, você me fazia ir da admiração ao ódio, do amor à raiva e a todos os extremos do não entendimento, e toda a fixação que eu tinha por você se explica quando eu percebo sem anteparo algum que você foi aquela pessoa que colocou a semente dentro da terra, e depois dela germinar partiu, e eu sofri pra crescer e lutei pra não morrer diversas vezes, porque no fundo eu queria acreditar que um dia você ia voltar pra perto de mim e a gente ia construir aquela história, que a gente construiu, e que com todos os espinhos, as pétalas, o frio, as cores, as noites, o vento, e as palavras de todos aqueles verões e invernos, que um dia quem sabe eu ia me encontrar com você, e por isso quando eu entendi o que eu sentia por ti eu acabei sendo como aquela árvore que perde todas as suas folhas no outono, e uma a uma elas foram caindo e me vi descendo com o vento e logo o chão nos meus pés estava amarelado e eu estava desnudo como todos aqueles galhos que já não escondem mais a luz do sol e o céu azul, e era por isso que eu queria que você tivesse olhado pra fora naquela hora, porque tudo que eu sentia você tinha se acendido e eu não conseguia mais esconder, e eu me sentia inebriadamente compelido a impedir e a querer ao mesmo tempo que a nossa foto nova, daquele presente de sonho, tivesse toda a intensidade, a força, e o brilho marcante que um retrato e uma lembrança únicos podem ter.