25 de abril de 2009


Existe alguma coisa no céu que me encanta. Sinto que o azul do firmamento e as estrelas, e as nuvens, todas, das cores mais diversas, tudo que é celeste prende meu olhar e me tira o fôlego numa sequência que não encontra mais fim. É como quando se está na praia à espera do fim das ondas, numa ciranda que obedece a sina de esperar a vaga melhor por partir, porque você já não sabia mais pra onde ir e agora mesmo é que você tem certeza disso. Existe alguma coisa suspensa no ar e eu acho que ela exala alguma coisa que me lembra liberdade, ou a vontade de ser. Existe uma nota que soa intermitente dentro de mim e que ecoa pelo vento como quem leva a semente que vai desabrochar e nascer árvore um dia, e que está à procura da melhor terra, pra melhor semeadura, e isso depende da força do vento e da sorte da semente. Eu sinto que existe uma casca quebrando, aos poucos, existe alguma coisa a ser dissociada e é aquilo que eu mesmo quero que seja feito em mim. Eu preciso do desprendimento definitivo daquilo que me traz a tristeza e o medo, de todas as sortes, daquela solidão-âncora em terra firme e de todas as decepções possíveis que eu tenho medo de viver. Porque esse é aquele em que eu somo em adição ao que eu escrevi e apaguei outro dia, e porque eu quero te entregar aquilo que eu tenho de melhor, na condição mais especial, no momento ideal, na sintonia mais perfeita que minha imperfeição pode gerar sendo quem sou. E eu queria que eu mesmo soubesse o que é que tem acontecido comigo, porque aquela estranheza parece ser teimosia, e isso é tão bom que hoje eu sinto como se há muito eu tivesse perdido alguma coisa e parece que eu encontrei. E ela tá insistindo em ficar, e o céu continua me atraindo, com aquela força que me hipnotiza e me satisfaz, parcialmente, porque eu ainda não me sinto desacorrentado completamente das correntes todas que me ligam ao tempo, porém eu acredito que a chave de cada cadeado vai chegar a tempo, e se eu conseguir sair daqui pra não chegar tão atrasado naquele dia, eu tenho certeza que o céu vai me fazer sentir, pela primeira vez, que eu consegui ser o garoto que eu me tornei.

24 de abril de 2009

Eu não sei o que escrever agora. E eu sinto uma necessidade incomensurável de fazê-lo. É como uma primavera inteira esperando por florescer, em cada jardim, nas avenidas todas, em cada botão de rosa, ansioso, curioso, impetuoso por desabrochar por inteiro. Como uma nuvem carregada de chuva, pronta pra chover toda a água, que há tanto carrega. Como uma semente que vê sua hora de germinar chegar e coloca sua raiz pra fora em busca de nutrientes e vida. Existe alguma coisa pendente no vento, como se o ar tivesse uma mensagem oculta mas sensorialmente perceptivel, carregado de impressões respiro-o, e acabo sorvendo a mim mesmo em cada inspiração, expirando vejo que já estou dentro de mim, procurando às vezes, pra não confessar que sempre, aquilo que estou à espera. E isso me atenua, me abrevia, me arrefece, me introjeta transformando. Porque eu não sou mais eu mesmo e quem trouxe isso foi você. Você me legou uma incorporação que marca pelo impressionismo e pela verdade. Simples e trivialmente adjetivando me perco quando sinto a tua presença. Minhas palavras se esvaem e eu fico atordoado e perdido como quando se levanta atrasado e se sabe que perdeu alguma coisa imperdível. Como quando está-se no melhor lugar pra ver um apoteótico momento ou quando assite-se ao desfecho de alguma coisa que esperou-se em demasia. As notas que escuto agora complementam cada letra que deixo aqui, porque como emblemas, tornam distintos meus entimentos. Esse é aquele em que eu descortino a magia que me tramou e que me teceu, numa só nuvem, num só céu, que agora onipresente existe sozinho porque não restou mais nada de antigo no firmamento, e tudo foi varrido pela tua aurora e cada pedaço do azul está aguardando pelo teu brilho e pela tua presença singular e coroada de predicados.

21 de abril de 2009


Esse é aquele em que eu tento dividir o que pode ser indissociável e insolúvel. Eu não estou entendendo bem as coisas é isso não deveria ser novidade. Na verdade as coisas são bem mais simples do que podem parecer, é como a neve derretendo numa manhã de inverno ensolarada, virando água e escorrendo pela calçada, evaporando em seguida quando encontra o asfalto quente fervendo por causa dos pneus cheios de pressa dos carros cheio de pessoas cheias de vontades de coisas diferentes. Um dia você apareceu e eu não sei se você sabia mas eu estava à sua espera. E isso significa que mesmo sem saber eu estava enchendo o armário me preparando por você. E eu cheguei num momento agora que é o de uma encruzilhada, na verdade minha vida marcada e dividida sempre foi cheia de descaminhos, desncontros e desventuras em série e sequência que se um dia eu tiver a oportunidade de dividir com você eu sei que você vai concordar comigo. Existe uma coisa ainda mais especial em tudo aquilo que eu queria dizer pra você, eu acho que existe alguma coisa em mim que existia antes e que eu nunca tinha notado. Eu queria que você soubesse que voce me trouxe uma espécie de liberdade diferente, que eu nunca havia sentido, que eu me desprendi de alguma coisa desde que você chegou e eu ainda não tive tempo pra ponderar mas eu acho que foi bom. E um dia eu achei que tudo isso era possível e pode ser que não venha a ser. Em verdade eu afirmo que tudo aquilo que eu sempre achei que fosse: era. E eu não tenho mais certezas porém estou cheio de impressões. Tingidas, bordadas, esculpidas. Quem sabe tenha sido tudo materialização espiritual, condensação do intangível, molde dos meus sonhos. E mesmo que seja apenas objeto da imaginação eu queria que você soubesse que eu estive de bem com as coisas, e que isso sim, é novidade. A confusão leve e persistente que encontra-se em cada extremidade de mim, agora divide espaço, em cada célula, com uma sensação engraçada e carinhosa. Eu não sei porque eu gosto, nem quando foi e nem quanto vai durar mas eu sinto que pode ser de verdade. E isso me impressiona pela forma explícita, pela transparência e pela felicidade que eu venho sentindo.

17 de abril de 2009

Eu queria que você soubesse que não deu tempo de preparar a tua chegada como eu queria. Faltaram as faixas, os balões, as cornetas, o lanche, as pessoas, a música, as cores, faltou quase tudo porque eu tenho um problema com atraso e que acho que dessa vez meu planejamento deu errado de vez. Eu sabia que você estava chegando, e o mais engraçado é que isso aconteceu de uma forma que eu não estava esperando. Existe uma sincronia ímpar nessa história toda. Eu queria que você soubesse que eu nunca estive tão preparado, nem me sentindo tão estranho. Há dias eu acordo com uma espécie de sentimento de conforto que eu nunca tive, é como se de um dia pro outro você tenha me enchido de vontade, e tenha renovado minhas forças, injetado ânimo, eu acho que houve uma transferência entre a gente e eu estou conseguindo perceber isso, como nunca. Às vezes eu tenho a impressão absurda de que eu estou em contato comigo mesmo, em uma outra fase, meio hoje meio ontem. E a tristeza, pertinente, a angústia, recorrente, a raiva que me envenenava, a desesperança que me dominava, todas as intempéries do meu próprio eu conflituoso foram varridas do céu que existe em mim pra um espaço distante do meu sentir. Eu queria que você soubesse que eu estou tranquilo e que eu não sinto uma incontrolável tensão de agir. Na verdade eu sinto uma espécia de calma envergonhada, como a desse texto por exemplo. Quando materializei a profecia da tua chegada eu estava inebriado pelos meus sonhos e por uma sensação boa que não era só esperança, era algo que amalgamava um teor especial, um matiz de ternura, uma essência cativa de bem, um espectro de completude. E esse é aquele em que eu encerro começando, que te digo que tua presença venceu minha ausência, e num ímpeto de coragem e segurança, afirmo que eu acho que os olhos que achava que tinha visto, eram sim, por fim, escuros.

5 de abril de 2009


Esse é aquele em que a noite é a verdade. Era uma vez um lugar, e nesse lugar existiam pessoas. Aquele não era um lugar qualquer, cada indivíduo tinha um recorte do espaço e podia utiliza-lo como bem entendia, de praxe, cada pessoa construia uma edificação no recorte que lhe era concedido. Dentre aquele mosaico pequeno e limitade existiam algumas pessoas especiais. Dois vizinhos se conheciam desde que se entendiam por gente, no entanto, nunca haviam trocado mais que meros instrumentos, um dia, com o passar do tempo, eles ficaram adultos o suficientes para proceder com a costrução, que começava para cada um, em ritmo mais lento, desde seu primeiro dia de vida. Em frente a cada obra havia um anteparo, branco, que escondia toda a obra, pois o segredo, diziam, era que nunca nunguém soubesse como e o que estava sendo construído, apenas pouquíssimos e rarefeitos indivíduos conseguiam permissão de alguém para perpassar, transcender, e adentrar por sob o anteparo. No entanto, às vezes, em determinada época do ano, numa hora específica, e singular, a luz da estrela que banhava aquele lugar incidia na obra por um ângulo ímpar, e a sombra projetada sobre o anteparo, nessa conjuntura, era única e latente. Nesse dia, um dos vizinhos estava passando pela calçada quando olhou para aquele anteparo, e naquele momento ele teve certeza, absoluta, que ele precisava conhecer aquela obra, porque ela tinha muitas coisas que lembravam a dele, a fachada, os contornos, a tendência, o porte, a genialidade, o brilhantismo, tudo erigido sob o signo de uma sobra cintilante, num segundo revelador. Com o passar do tempo os vizinhos acabaram se conhecendo e um dia aquele que havia visto o momento ímpar pediu para adentrar o limiar, e o outro só aceitou com a condição de que precisaria visitar a obra do outro primeiro. Pois não, o vizinho entrou na construção ao lado, revirou cada pedra, teve acesso a cada escada, visitou cada cômodo, sublinhou com a mente cada afresco, memorou salientando cada coluna. Depois disso o vizinho que abriu as portas de seu maior segredo pediu para ter acesso, enfim, a construção do outro, e aí o que se sucedeu foi uma intensa tormenta do destino. Enquanto se dirigiam ao outro anteparo o céu nublou, escureceu, as nuvens enegreceram e os relâmpagos começaram a soar, o ventu surgiu numa velocidade assutadora, e quando eles adentraram pelo limiar, o vizinho antes cheio de curiosidade e expectativa percebeu que a maioria das portas estava fechada para ele, que as escadas estavam bloqueadas, os acessos trancados e que apenas algumas áreas estavam abertas a visitação. Tempos depois o vizinho que havia aberto as portas do seu edifício percebeu que muitas outras fachadas de outros lotes de outros vizinhos estavam cheias de suas idéias, que os interiores secretos e sigilosos que ele havia repartido de todo o seu coração haviam sido violados, maculados, e ele se perguntava o porque desse desastre. O porque de uma visita que levou consigo seus sentimentos, seus segredos, seu trabalho, árduo, de construção de uma vida toda. A dúvida do porque seu vizinho-exemplo-herói-afeto havia feito isso com ele.

3 de abril de 2009

Esse é aquele em que o espaço se encheu de certeza. Eu queria que você soubesse, mesmo sem poder agora, que você está chegando. Eu tenho convicção, plena, que você está a caminho. E eu não tenho essa segurança toda, mas eu acho que eu já posso ter te visto, não sei, tava meio escuro lá, e eu não distingui se teu olho era claro ou escuro, eu não conseguia olhar pra você por muito tempo, e acho que você também não. Eu queria que você soubesse que você mexeu comigo, e foi doce. Eu não imaginava ninguém, com os pés no chão, pra mim, há tempos. E eu me vi com você, e eu queria muito que você soubesse disso agora. Quando você chegar e puder ler você vai perceber como esse dia foi especial. Eu queria que a gente tivesse trocado mais que aquele sorriso escondido e aquele olhar censurado. Eu ia pedir o teu nome. Até imaginei uma lista, pequena, sei que parece bobagem, mas que parece combinar tanto contigo. Eu queria que você soubesse que o que eu achava que faltava não era falta: é excesso. Eu acho que você me fez encontrar o que eu tava procurando sem saber querer. Eu percebi que está extravasando ao invés de faltar. A ausência que eu percebia não era falta, é presença, invertida. Eu queria que você soubesse que eu preciso dessa troca. Como nunca. Como sempre. Eu quero te dizer que eu vou encurtar o caminho, que eu vou sair mais cedo e que eu vou tomar todas as medidas, impossíveis e possiveis pra chegar mais perto, eu até vou ao teu encontro, não sei como, mas eu vou buscar essa coragem no fim do mundo se eu puder. Então vem. E vem depressa, porque eu tenho tanto, de tudo, que eu sei que é aquilo que você também quer e não encontra, ou que busca mais não vê onde pode achar. Eu queria que voce soubesse que eu senti você perto de mim. E foi bom. Eu acabei esbarrando em você sem querer querendo e é por isso aque a gente precisa se achar. Quando você sentir que for a hora levanta e me olha, na alma, e eu vou saber que é você, porque nesse momento eu também vou estar te vendo, e eu vou enxergar os teus olhos de perto e então, finalmente, vou poder saber se eles são claros ou escuros. Eu acho que são escuros.

26 de março de 2009



Eu queria que você soubesse que esse texto foi escrito depois de uma sessão de cinema do dia 26 de março de 2009. E eu queria te dizer que você foi o meu primeiro melhor amigo de verdade. Eu já tinha tido outros amigos, pessoas com quem me dividia, por quem lutava, pessoas com as quais eu planejava meus sonhos e compartilhava as minhas idéias, no entanto, com nenhuma delas eu podia ter sido eu, e contigo eu pude. Eu queria que você soubesse que você é uma das pessoas mais fantásticas que eu conheci em toda a minha vida. Eu agradeço a deus ou ao que quer que seja que rege as nossas vidas sempre que me lembro que um dia eu já pude falar com você, eu agradeço por ter tido a oportunidade e a chance de ter sido teu amigo. Quando eu olho pra todos esse meses desse mais de um ano de convívio eu vejo sonho realizado, vida e felicidade. Porque? Porque você me deu a esperança, real, de que um dia eu poderia vir a ser feliz. E eu queria te lembrar que isso não é idolatria, nem nada do gênero, isso é sinceridade, sentimento e verdade, porque você também me ensinou o que é ter um coração bom, qual é o valor do caráter e porque devemos ter princípios. Eu queria que você soubesse ainda que eu teria milhares de frases e palavras e coisas pra te dizer, pra ressaltar, adjetivar, consubstanciar, porém não precisa. Você já sabe tudo que eu vou dizer. Eu desejo pra você toda a felicidade do mundo. Eu não sei aonde você vai morar, com quem você vai estar ou que você vai ser. Eu não sei qual é o teu futuro, se é em São Paulo, Brasília ou Nova York. Mas não importa onde , como e com quem. Eu queria que você soubesse que foi você quem me ensinou que algumas coisas são pra sempre. Eu sempre vou te admirar, vou torcer por você, vou ser o teu maior fã. Cara, eu não sou teu pai, nem teu irmão, muito menos teu parente, mas eu queria, por fim, que você soubesse, que eu morro de Orgulho de você. Obrigado por ser meu eterno maior exemplo. (e por tudo que você sempre fez por mim)
Do teu pra sempre amigo,

22 de março de 2009

Eu quero te dizer obrigado. E quero te dizer também que eu tenho algumas perguntas. Eu queria que você soubesse que o meu maior desejo, nesse exato instante, era estar na tua frente, face a face. Eu queria poder te dizer cada interrogação e eu queria que todas, todas as palavras sem excessão fossem ditas. Eu queria experimentar essa experiência mútua, bilateral, sincrônica, sincrética, amalgamada, de poder olhar nos teus olhos ouvindo a tua voz, e eu queria conversar contigo sobre absolutamente tudo que eu tenho vontade, e que queria que você me respondesse de peito aberto, com afeto, amizade, confiança, lealdade, atenção, eu queria que a gente pudesse trocar nossos sonhos e nossos sentimentos de verdade. Eu não sei se você sabe mas eu sempre gostei de você. Eu gosto de você porque você é uma pessoa especial. Eu tenho memórias, lembranças, imagens, cenas, fotografia, passado. Eu queria muito que você fizesse parte da minha vida, e você faz. No entanto porque a gente está nessa encruzilhada é uma pergunta que me desceu hoje inteira. Eu acho que quando a gente gosta de alguém, de verdade, não existe lado. Existe a gente. Amizade é amor por que a gente vibra, torce, vive, sorri, discute, conversa com o outro. Amizade é parceria, não competição. Amizade é contato, bem-estar, paz, amor. Amizade é liberdade. É a qualidade de poder ser quem se é com o outro. Eu queria muito que você soubesse que você me ensinou muitas coisas, boas e ruins. Eu queria que você soubesse que se eu pudesse voltar atrás eu teria reescrito muita coisa, e não tenho medo de dizer isso, eu teria voltado anos atrás e teria feito muita coisa de outra forma. Isso, porém, não existe. E o que há, é esse exato minuto, em que eu quero que você saiba que esse é aquele em que eu abri todas as portas do meu coração e da minha alma, e é aqui, despido de todo o manto de sentimentos e ímpetos que me revestem que eu te digo: eu queria que só existisse o nosso lado. Nem meu, nem teu, nem dele. Só o nosso. E que a gente pudesse seguir junto, até onde a vida nos permitisse, porque a gente tem muito pra viver e pra conquistar. E eu só quero ser feliz, fazendo quem eu gosto também. Porque eu acredito, de todo meu coração, que isso é viver.

20 de março de 2009



Esse é aquele em que ele precisa deixar as palavras sairem, já que não podem de outra forma. A distância faz da percepção uma qualidade mutante. O espaço transforma a impressão, acentua o sentido, faz da ausência a presença invertida eterna da qual somos pacientes. Ele não sabia o que escrever, não sabia o que dizer, que palavras pronunciar. Porque a complexidade das pessoas às vezes era de uma demasiedade intragavel, inabsorvível, inassimilável. Ele queria que as coisas fossem mais simples, mais claras, mais sinceras e verdadeiras. Ele queria dizer que as coisas não precisavam ter que ser assim. Pessoas não são objetos, brinquedos, peças de um jogo de montar. Naquela manhã tudo tinha sido tão perfeito e tão brilhante que o tempo poderia ter congelado e se perpetuado sempre assim. Não que não devesse cruzar a linha cronológica arrastando e levando as coisas e remodelando, tudo, num ritmo novo e intenso. Ele queria dizer que esperava ,sim , o melhor das pessoas. Ele queria dizer que acha que afeto existe, que lágrimas talvez não adiantem, e que não há falta na ausência. Ele queria deixar claro que poderia estar tudo certo. Mas que não depende só dele. Você sabe disso. Não existe controle. Segurança é ilusão. As palavras o abandonavam no mesmo ritmo em que um mar de sentimentos e letras o envolvia. Olvidar é cruzada. As perguntas, todas, as verdades, meias, as omissões inteiras, as mentiras partidas O caminho entrecruzado de sempre. A espera de quem se deixa afetar, eis de onde vem afeto. Ele queria sinceridade e verdade. Porque esperança é fé e amizade é amor.

18 de março de 2009


Esse é aquele em que ele tem certeza e que diz tudo o que acha que quer dizer. Tudo era silêncio e barulho. Ele estava em pé, dançando, parado, a música ritmada com o movimento do seu peito, as notas enchiam o ar escuro, não havia noção de tempo, seus braços abertos, os flashes que desnudavam, pontuais, flagravam seu ensaio não tão solitário, o gelo seco impregnava o ambiente, misturando-se. Naquele momento todas as pressões cessavam, arrefeciam, calavam-se, e só restava a ele escutar. Não havia nenhuma presença, as portas estavam todas fechadas, lacradas, impenetráveis. A sensação era a de um viveiro hermeticamente vedado embebido em noite e voz. A busca pelo imaterial consumiu cada movimento e passo e a presença invertida do que sentia percorria cada centímetro de sua alma. E ela pulsava latente, cinza, viva. Escolha pelo que se acredita que é o melhor, conquista do que se acredita que é bom. E a história repetia-se novamente, interiorizando no âmago uma ordem que jazia agora sem lei. Seus sentidos cegados pelas indicações, parciais, montadas, jogadas, dúbias, convenientes, mecânicas, frias, insanas, premeditadas por uma genialidade que se pretende a invulnerabilidade. Que se pretende. Fortaleza que era alvo do mais contraditório ataque, página da batalha invertida. As canetas que deveriam acompanhar-se na redação da história não pareciam escrever o que deveria ser escrito. Faltava tinta, afeto. Faltava verdade. A instrumentalização da vida lhe embebia de pavor e perplexidade. O interesse, unívoco, unilateral, da singularidade, retroagia no tempo como um espelho frente ao outro. Os olhos estavam abertos agora, e seus braços continuavam esticados, fluindo, no escuro, com os mesmos flashes, pontuais, e a névoa branca invisível o engolfava. Pouco a pouco o tempo lavava a alma tingida, e a canção que dividia a imagem, descolorindo caminhos, chegaria ao fim, terminando por revelar o que restaria de suas certezas, manchadas.

13 de março de 2009


Eu estava sentado num banco plano, preto e macio, com uma meia luz amarelada, e macia, sob um chão de porcelanato, branco, perolado, quase na troca de um dia pro outro, num ambiente amplo e agradável, e eu estava ouvindo a voz que me suspendeu do meu sono, e que por conseguinte me legou a abertura dos meus olhos pra vida. E a voz me dizia, com todas as letras que uma pessoa pode dizer, que tem pessoas que não sabem enxergar o outro, que tem gente que acha que as outras pessoas não podem ser melhores do que elas ajulgam que elas são, que as pessoas tem histórias, sentimentos, uma vida inteira, e que as pessoas podem sim, se importar com as outras e lhes querer seu bem. Nessa hora eu parei. Quer dizer, não sei. Acho que eu acelerei tanto que eu morri e nasci ali, de novo, pela centésima vez nessa vida, mas foi diferente porque naquele mesmo instante eu acordei diferente. Eu tenho a estranha mania de acreditar no melhor das pessoas. Eu acho que eu sou assim porque eu tenho um coração, bom, e agora, mais do que nunca, eu percebi isso, e essa minha característica, ingênua, romântica, sonhadora, explica muita coisa, de sempre, da minha vida toda. E eu levei a voz até o seu destino, e eu a ouvi por todo o percurso, e ela me disse tantas coisas legais e bonitas que eu cheguei a mais conclusões que não são definitividades: são as impressões da vida em mim, eu sou marcado pelos sentimentos e pelas vivências do meu trajeto. Eu amo as pessoas. Muito. E eu queria dizer às vezes eu sou tão feliz por causa delas que eu não acredito que essa é a minha vida. Mas é. E acabou essa história de dizer que o que eu vivo não existe, que nada disso é real. Sim, isso é sério, existe, e isso, pra mim, é viver.

3 de março de 2009


Naquele momento o céu era o chão e tudo acontecia ao mesmo tempo numa sincronia esférica, global e obedecendo a uma ciranda giratória. As nuvens eram as pessoas e tudo se aglomerava bem como se separando, passos condensavam-se ao som de um vento musical, de luzes monocromáticas que desenhavam nas testas, nucas, ombros, mensagens visuais inintelegíveis, a ordem era uma só. E a ansiedade curiosa de umas centenas de semanas daquela vida foi dissolvida em poucas horas de intensos passos desritmados que acompanhavam as batidas energicas, elétricas, conhecidas ou não. Cruzavam-se olhares diversos, divergentes, aparentes, cautelosos, pretendidos. Era como o novo de sempre (e todo o seu contato e consequencia),mas havia sido mais. Dias depois,a brisa sonora voltava trazendo as marcas, agora sim, indubitavelmente, ganhas: cada passo de cada degrau, e cada minuto de cada hora era uma vitória sobre cada uma de suas dúvidas e de seus medos. A companhia dos mosqueteiros era um brinde a sua espera, a seus sonhos e a seu romantismo inapropriado. E naquele dia que cruzou o tempo e trouxe como inédito o espaço, pela primeira vez, estreante, quem chegou foi a manhã, e o tempo nasceu ao invés de partir contrariando todas as previsões em contrário. Na areia o vento era gelado como um nascimento, como quando deixamos o aconchego do ventre para nos encontrarmos com nosso caminho a ser traçado, os retratos eternizaram semblantes novos. O amanhecer singelo e especial despontava sobre a água infinita coroando cada palavra proferida e todas as frases omitidas. Todas, cada uma delas era banhada agora na sensação única e inexplicável, daquela inenarrabilidade concernente ao universo particular de cada um, pela satisfação de uma pintura realizada, de um fundamento firmado na eternidade. Cumprindo a sina da vida estivemos. E a viagem (metafórica ou literal), de um verão (pra não se esquecer jamais), deixou arraigado e intangível, a visão de uma vida possível e real, onde a superioridade do poder ser encerra todas as inevitabilidades da vida, de uma felicidade dissolvida, onde fazer bem feito é lei, e a ordem é o que é difícil. A profecia se materializou em história, em sentimento, em fantasia, e as consequencia geradas pelas mudanças ecoam, trafegam, flutuam, e se processam com intensidade inigualável. Cada amanhecer revela mais um pedaço de mais uma folha da história que trouxe o dia que ao invés de partir, veio. Do inverso que é plenitude acertada: Sonho é Destino.

22 de fevereiro de 2009


O entardecer estava maturado, colorido, não vibrante mas tocado, como uma primeira mão de tinta numa construção em vias de acabamento. O edifício estava de pé, finalmente, e a espera pela conclusão fora a jornada mais longa, temerosa, pesada e complexa de toda a sua existência. Atravessar o tempo junto significa cruzar as barreiras intangíveis impostas pelo envelhecimento e pela passagem de etapas e linhas imaginárias mas tão reais ao mesmo tempo. A simultaneidade de uma vida dividida estampava agora, neste exato momento quando a luz azulada do dia migrava pra além, todas as marcas vívidas, definitivas e exemplares de um processo. Os caminhos se cruzam como uma trama irreal, inimaginável, inacreditável, duma maestria ímpar, singular, brilhante, de acasos perfeitos, encaixados, substancialmente ligados. História quintessencial que não é roteiro de cinema, script de novela, romance de banca, é fato, indubitável, da orquestra autônoma da vida. Cada cor que tingia o céu e as nuvens naquele entardecer ressaltavam e coroavam o fim do ciclo mais longo, e o começo de um novo processo, ainda mais renovador, intenso, marcante e único. Todas as palavras ditas. Todos os sentimentos endereçados. Toda a história vivida. As luzes de todos os postes se acendiam e vibravam. A cidade anoitecia ao som inaudível da satisfação de uma estação inenarrável e insolúvel no tempo, do mais apoteótico afeto, da melhor conquista, da mais especial e sonhada amizade.

15 de fevereiro de 2009

Uma montanha-russa ao contrário, uma estação em que se embarca pra voltar, um vagão de cabeça pra baixo. Tudo aquilo que era pertinente à estação de trem estava do avessso, numa ordem inintelegível, aleatória, caótica e desordenada. Embrulhava o estômago dele ter que ver e presenciar. Sentia como se lhe colocassem uma mão dentro do peito, e lá dentro, era como se um punhal fosse descoberto, silenciosamente posicionado e então ele era rasgado por dentro, mutilado, não havia piedade alguma, não havia misericórdia nem redenção. A dor explodia dentro do seu peito e cegava sua mente, os gritos surdos subiam e desciam pela garganta e ele não conseguia ver mais nada, ouvir mais nada, sentir mais nada. As implosões não cessavam, se sucediam, demoliam cada estrutura, cada resistência, tijolo por tijolo dos muros pretendidos a proteger o castelo. A contradição de sentimentos o aniquilava, e cada segundo a diante naquela montanha-russa às avessas, era como um mergulho no vazio da ausência, da voz que não perpassa a boca, do lábio perdido no escuro, do sorriso que sempre oculta a lágrima. Eu não sei como, mas eu não queria ter olhado pra fora.

12 de fevereiro de 2009


Eu não sei como, mas você deveria olhar pra fora agora.

31 de janeiro de 2009


Minha violência é um monstro às avessas. A energia da dor e do sofrimento alimenta um ser que é como veneno letal condensado, de uma dor mágica e enegrecida pelas formas e pelo tempo. Ela é uma cobra sem boca, uma abelha sem ferrão, um escorpião sem cauda, uma água-viva sem toxina, um orifício sem espinho, um leão sem dentes, um gavião sem olhos. Minha violência não extravasa, ela se dissolve em mim e se acumula em cada extremidade, em cada pedaço de meu corpo, estou tomado pela raiva e pela culpa, e como não consigo extingui-las, nem esquece-las, nem transpassa-las, elas me envenenam, me envelhecem, me definham, minha violência me mata por que ela compete com o ímpeto de vida que habita em mim. Minha raiva e meu ódio não podem ser compartilhados porque não mudam a história, porque não reescrevem meu nascimento, porque não alteram a dor do que passou, as palavras que foram ditas, as cenas assitidas, os socorros não atendidos, minha raiva é como um amor não correspondido, como minha maior e mais profunda paixão rechaçada na mais perfeita comparação, na mesma proporção. Pergunto agora o que faço com toda a dor, a mágua, a raiva, a rejeição, e aqueles dias eternos dessa vida tão curta mais tão marcada, o que fazer de uma vida que começou torta, errada, incompleta. Eu não encontro reflexo do que sinto no mundo palpável, meus sentimentos são indesejáveis, condenados, desaprovados, inoportunos. Onde foi que eu errei é mais uma indagação, da coleção mais absurda e crua que tive de ouvir. Erro? Talvez nascer seja um erro, do qual sempre me atribui culpa. Hoje, com a ciência de que não posso retornar pra tentar ser diferente do que sou me resta a confusão que me domina. Quero encontrar a válvula que libere, a substância que metabolize, a palavra que trucide, o encontro que dilacere, quero que minha violência morra e que não me mate, quero que meu ódio me abandone e me deixe só, como sempre fui e sou, quero que minha mágua parta de mim em cada lágrima como essa, agora, que escorre do lado esquerdo da face, quero paz pro passado que não volta e luz, faço esse pedido de urgência e de entrega, porque meu futuro é negro, as sombras se espalham pelo chão e meus passos são cegos, meu presente de espera e dor é tortura, e eu proclamo, com cada letra de cada palavra que ainda posso proferir, que eu não aguento mais. Minha vida é um acumulo absurdo de lembranças e medos, de rejeições e isolamentos, a solidão que é defesa também é prisão, e a exclusão de um amor que ama e que machuca e que o faz pretendendo incluir é meu maior algoz. Eu não escolhi tanta coisa, a maioria das coisas que aconteceram comigo eu não tive como escolher, como uma criança pode saber o que sentir ou não, o que ouvir ou não, o que assitir ou não, como repartir algo que não pode ser repartido. Eu só não sei das coisas, eu não sei quando, nem onde nem como porém um dia isso tem que acabar, e eu espero, com todas as forças que ainda restam dentro do meu coração, que a esperança continue a me guiar, e que eu saiba subir desse poço, fundo e escuro, gelado e infinito no qual eu cai, e que minha âncora seja leve pras minhas asas, e que não me acorrente, nas profundezas, na pedra mais pesada, pra sempre, até o meu fim.

28 de janeiro de 2009


É no amanhã que sinto a tua falta. Numa daquelas minhas viagens por ai, li um depoimento que foi como um reflexo, me senti escrito como quando você se olha no espelho, e naquele dia, se reconhece naquela imagem que ali está refletida. Sim, eu sinto saudades de coisas que não vivi, eu tenho medo de ficar sozinho e de perder coisas que não me pertencem, é como se eu esperasse por ter aquilo que eu nunca tive mas que eu sinto como deve ser ter. Uma vez eu achava que eu gostava do que não existia, e o fazia por não entender o que eu sentia e por não saber nomear o que me agita, me atormenta, me suga, me injeta, me amortece, me vitamina, me mantém, me segura, me entrega. Eu ainda não sei nomear as coisas mas começo a reconhecê-las, e as desejo, ainda que de forma tímida, culposa e parcial, pra mim e por mim. Não me imagino realizando-as, muitas vezes elas são um combústivel imaterial que me leva em sua direção e que dúvido muito que conseguirei encontrá-las. Meus desejos e sonhos são o que me mantém vivo, é como uma âncora-combústivel, que me alimenta e me acorrenta simultaneamente. Eu sou uma pessoa simultânea, e vivo uma vida una, porém dividida, recortada por condicionamentos materias e sentimentos que não escolhi, é estranho não querer ser quem se é, ou então querer ser quem é porém diferente. Sempre os iguais-diferentes, a busca do outro em você, eu tenho um problema com felicidade. Eu não consigo ser feliz. Eu tenho um vazio, uma dor, uma coisa estranha que me perturba, que me faz nunca querer estar onde estou, que me dá gosto por músicas tristes e que me escraviza dentro de mim mesmo, como um escravo açoitado por um capitão-do-mato que não é ninguém mais ninguém menos do que ele mesmo. Eu ainda sou aquele adolescente atrasado, que está descobrindo o mundo, pela primeira vez, como se sua vida não tivesse sido uma estréia, e sim um ensaio infértil e infrutífero. Foi um fracasso pra ser franco. Naquelas horas de nó na garganta e lágrima pronta pra escorrer, eu sinto como se eu fosse explodir implodindo, e minha vontade é de desligar, sem eufemismo, eu tenho vontade de morrer por que isso me silenciaria, faria aquelas vozes que gritam dentro de mim se calarem e quem sabe aquela coisa que me tortura e me persegue definhe e desapareça com o meu fim. Eu acordo e vivo todo dia movido pela esperança de um dia poder ter o que não tenho, de possuir o que não possuo, de viver o que não vivo e sobretudo o que não vivi. Eu tenho esse desejo absurdo de me realizar, de ser feliz adoidado e de fazer outras pessoas felizes. Meu desejo é de entrega, doação, cumplicidade, troca, amizade, carinho, amor. Eu desejo compreensão e um companheirismo cheio de coisas que se parecam comigo mas que sejam diferentes de mim, para que eu possa estar sempre mudando, me transformando e me compeltando. Numa ciranda que persegue a perfeição e que realiza com maestria a sina da vida. Me imagino numa sacada limpa, fresca, com um vento gostoso, leve, sentado numa cadeira macia, com uma bebida gelada, olhando pro mar lá fora através dos olhos de uma pessoa que olha pra lá e que sorri, que está ao meu lado viva, limpa, brilhante e linda, alguém especial, que mora em mim e que me faz ficar aqui, sempre, na mesma sala de espera.

16 de janeiro de 2009

Era um caminhante solitário, desengonçado, e triste. O vento em seu rosto era fresco, lavado pela chuva ele trazia encerrado em si a noite e o entardecer certeiro e gradual. A grama em seus pés estava verde, viva, vibrante, havia gotas fixas em toda a parte, em toda folha, como se num mosaico salpicado, bicolor e translúcido. No limiar do caminho estavam as pedras, sujas de terra, borradas num marrom manchado, forte e tenaz, ao longe se avistavam os pássaros, partindo, pra longe. E a sua companhia era a canção que tocava todo dia no mesmo tom, cantada pela mesma voz, acompanhada pela mesma dor, uma dor que não lhe doia na perna, no braço, ou nas costas, era uma dor estranha, intensa e branda ao mesmo tempo, uma dor que não passava, que esmorecia e revigorava-se sempre, uma tristeza leve e persistente. Seus pés calçados ignoravam a sola de seus calçados, e estavam molhados, atendiam ao tato sentindo a água gelada da chuva, intermitente, teimosa, cinza, como se os céus fizem a sua vontade. O garoto tinha lágrimas guardadas, extravasando, enchendo-lhe, na borda de sua razão, a fonte de sua distinta resistência. As árvores balançavam ao som do vento, como se em sintonia, ora leves, ora agitadas, elas cantavam ao seu modo, acompanhavam seu caminho, correspondiam à sua presença com sinais sonoros. Ele caminhava devagar e deixava a água escorrer por suas roupas, agora encharcadas, e tentava fixar seu olhar no horizonte, nublado, turvo, inconsistente. A palma de suas mãos mexia em seus cabelos como forma a suavizar sua tristeza, quem sabe talvez elas procurassem uma entrada para sua mente, uma forma de apalpar o que doia, de retirar o que latejava, de atenuar seus sentimentos, gastos, confusos, inconformados, marcados pelo caminho que jazia pelos seus passos traçados. A noite caía mais uma vez, junto dela raiava a primeira estrela, luzindo, perene, no começo do céu, acima da borda nublada e ainda clara pelos restos do dia. Suas roupas estavam pesadas e seu corpo já não lhe respondia mais como antes, cada passo era mais gelado, difícil, e cansado, e suas memórias vivas pareciam lhe dizer pra parar, pra encerrar essa jornada louca, solitária, esperançosa e penosa. Cada árvore acomodava-se agora que o vento arrefecia, grilos, esparços e cigarras, juntas, emitiam suas vozes com vigor, paixão e vontade, sensações e sentimentos que o abandonavam pouco a pouco, sua vida era como uma âncora em terra firma a ser carregada, apesar do costume, ela nunca estivera tão pesada, e residia nesse fato, da fadiga e do esgotamento, a essência dessa dor crescente e forte, uma desesperança tão real e palpável que ele já sentia o frio da noite nos olhos que marejavam e soltavam aquelas lágrimas salgadas, concentradas, retidas, e ele cedeu à força do peso, e sentou, na noite caindo, fria e gélida, sob aquela chuva sem vento, numa paz irônica e cruel, sob os pontos cravados de estrelas longínquas no céu e sonhos perdidos nos seus passos, pelo caminho marcado, que ficava para trás, sozinho.

15 de janeiro de 2009


A música soava leve e sincera, e ricocheteava em sua alma, tocava em cada medo, em cada temor, em cada sonho, cada espera, cada necessidade postergada, silenciada e amordaçada. Ele caminhava meio sem saber o que esperar, o que pretender, o que querer, na verdade, quanto mais se conhecia e sabia, menos entendia, uma razão estranha, uma ordem que não era dele, determinações, rótulos, marcas de uma vida tão descolorida, tão traçada a caneta, sem direito a borracha, lápis, correção branda, com coloridos de lápis de cor emprestados, ausentes, diminutos, rarefeitos. Amar era como o estranhamento de um encontro, como uma espera boa e gelada. Ele era um garoto que amava, em silêncio, em volume alto, ele amava em tantos tons, em tantos matizes, ele amava em canção, ele amava em palavras, ele amava em olhares, e ele amava cada dia quando acordava, e era cego, e inebriado, e tonto, e ele era tudo o que era pelo amor. Ele amava demais, e talvez amasse errado, ele era entupido de amor, amor que não fluia, não trocava, amor que não tocava, não sentia, amor que não se permitia, que se acorrentava, se escondia, amor que confundia, que atordoava, quem sabe tudo sempre fora questão de amor e dor e sentir?
Havia umas lágrimas escondidas em cada nuvem de cada pôr-do-sol dos últimos dias, havia um sentimento de tristeza por trás de cada música, cada filme, cada beijo assistido, em cada eu te amo visto, havia medo, tristeza, culpa e dor por de trás de cada palavra dita e sorriso entregue, havia tanto a ser discutido por ele. Havia amor, e tristeza, e a espera, e isso era tudo. Ele se montava todo dia, se desmontava em cada crepúsculo e ele pensava quantos dias mais, quantas semanas, quantos meses ainda resistiria a essa auto-linha de montagem, a esse medo de viver, a essa resistência de dor, a essa mágua do mundo, a esse céu escuro de nuvens carregadas que não deixavam espaço pra entrega, como a de cada raio de sol, em cada novo alvorecer.

11 de janeiro de 2009



Era como uma praia cinzenta, num inverno incessante, num fim de tarde nublado, gelado e escurecendo. Seu interior tinha tantas semelhanças com aqueles cenários, paisagens que traduziam suas emoções, cada novo dia, mesma vida estática, congelada, derretendo aos poucos, num degelo que obedece a uma lógica absurda e inversa. Ele sempre chegava a conclusão de que estava cansado. Um nada sempre adormecido despertava, e com ele a força destrutiva e irrefreável do vazio. Um silêncio tão gritante e pavoroso que extinguia cada sopro de vida, que eliminava cada feixe de luz, que definhava cada sonho, detalhe por detalhe, e os desfiava até sobrar um monte de ilusões gastas, recicladas, novas e velhas simultâneamente. As folhas que ele teimoso fez nascer, e brotar, e ganhar envergadura cediam ao passado de ausências, dor e medo e emagreciam como sua face jovem e marcada. O caule que sonhava ser vistoso, e que havia estado na transição de seu verde juventude para o marrom adulto, interrompera seu ciclo, ele enegrecia e se tornava mole, como se num choro interno, morrendo, não pudesse pedir socorro mas pedia. Ele tinha vontade de renascer ele diferente. Como o sol que irrompe a escuridão de cada manhã, ele queria amanhecer sem marcas na sua pele tão gasta, ele queria que suas mãos fossem tão mais lisas, e que o toque áspero não lhe pertencesse, ele queria ter os olhos brilhantes, de oceano, que ele já portara, ele queria receber novamente a capacidade de estado sinistro, gauche, ele queria ter podido ser tão feliz. O passado era como um jantar atravessado, mal digerido, não mastigado, como aqueles remédios encapsulados que somos obrigados a tomar e que nos trancam a garganta. Suas pontadas eram cada vez mais agudas, pontuais e concentradas. O entendimento havia trazido mais certezas e mais confusão. O céu nublado, a canção triste, incompreendida, sua alma cheia de inflamações, tantos cenários, quantos personagens e na soma de balanço, que tremenda solidão. O macio dos lençois rasgados ia embora com a incapacidade de exercer seu papel, o tempo chamava o tecido de volta, a se tornar resto, a se decompor em paz. Os gritos mudos de dentro dele ainda não tinham cessado. Ele estava cheio de um vazio povoado, de uma confusão pretendida a ordem, de barulhos inaudíveis, de canções tocando sem autoria e letra. Os tantos não fins de todas as histórias não suas eram muito para tão pouco espaço, as grades não eram tão maleáveis, sua capacidade não era tão dúctil, sua força era muito mais volátil do que sua esperança, seu medo vencia sua coragem, e a cegueira pela dor forçava a luz a não voltar mais, a reluzir dourada, e intensa, e por fim, se extinguir.